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Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva e atua com foco na saúde e qualidade de vida

Coluna Nutrição Além do Prato

O que vem depois do Mounjaro?

Por que o tratamento não termina quando a balança desce

Medicamentos como a tirzepatida, conhecida como Mounjaro, mudaram o cenário do tratamento da obesidade. Estudos recentes mostram que pessoas com sobrepeso ou obesidade podem perder entre 15% e 20% do peso corporal quando o medicamento é associado a mudanças estruturadas no estilo de vida. O impacto vai além da estética, com melhorias importantes em glicemia, colesterol, pressão arterial e qualidade de vida. Mas uma pergunta permanece: depois que o peso diminui, o que acontece?

Antes de falar sobre a manutenção, é importante esclarecer quem realmente tem indicação para usar esse tipo de medicamento. A tirzepatida é indicada para adultos com obesidade ou para quem tem sobrepeso associado a condições como pressão alta, colesterol elevado, resistência à insulina, diabetes tipo 2 ou apneia do sono. Ela não é indicada para menores de 18 anos nem deve ser utilizada como ferramenta estética ou sem acompanhamento profissional. O núcleo do tratamento continua sendo alimentação ajustada, atividade física regular e acompanhamento multidisciplinar. O medicamento entra como um recurso que pode ser utilizado quando necessário, e não como algo obrigatório ou central.

Essa visão é fundamental porque a obesidade é uma doença crônica que envolve fatores biológicos, comportamentais e ambientais. Quando a pessoa emagrece, o corpo passa por uma série de ajustes naturais. O gasto calórico tende a diminuir, a fome pode aumentar e hormônios que regulam saciedade e apetite se modificam. Isso não tem relação com força de vontade, mas com mecanismos de defesa do organismo. Pesquisas mostram que, quando o medicamento é suspenso sem que hábitos tenham sido construídos, o peso tende a retornar, muitas vezes acompanhado da piora dos marcadores metabólicos. A principal mensagem é que o remédio pode ajudar no processo, mas não resolve sozinho.

É por isso que o que acontece durante o uso é tão determinante para o que virá depois. A manutenção do peso depende da construção de hábitos sólidos. Alimentação que promova saciedade, preserve massa magra e se encaixe na rotina. Rotina organizada. Sono de qualidade. Gerenciamento do estresse. E especialmente o treino de força, que é uma das ferramentas mais importantes para preservar o metabolismo, proteger a massa muscular e evitar o efeito sanfona.

O medicamento não substitui esses pilares. Ele atua como um apoio temporário que facilita o processo inicial, reduz o apetite e ajuda a pessoa a entrar no eixo. Mas o tratamento precisa ser acompanhado para que doses, tempo de uso e ajustes sejam definidos de forma individual. O objetivo é que o medicamento seja um suporte dentro de uma estratégia completa e personalizada, e não uma solução permanente.

O maior risco aparece quando a tirzepatida é utilizada como atalho, sem mudanças de comportamento e sem apoio profissional. Nesse cenário, a perda de peso é geralmente passageira. Ao interromper o tratamento, o corpo tende a retomar o padrão anterior, e muitas vezes o peso volta rapidamente, acompanhado da sensação frustrante de “descontrole”. Por isso, o foco não deve estar apenas no peso que se perde, mas no que se constrói ao longo do caminho.

Em resumo, o Mounjaro trouxe avanços importantes para o tratamento da obesidade. Ele abre portas, facilita o processo e ajuda a reduzir barreiras fisiológicas. Mas o que garante o resultado duradouro não é a caneta e sim o conjunto de hábitos, comportamentos e escolhas que sustentam o novo peso. O medicamento pode iniciar a mudança, mas a continuidade depende da rotina e das estratégias bem definidas para cada pessoa. Tratar obesidade não é uma fase, é um cuidado contínuo que se fortalece todos os dias.

Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva, formada pela UNICAMP (Universidade de Campinas) e com pós-graduação pela USP (Universidade de São Paulo). Atua com foco na promoção da saúde e qualidade de vida, melhora da composição corporal e da performance esportiva. Por meio de uma nutrição com propósito, respaldada na ciência, busca promover autonomia alimentar com estratégias individualizadas, eficazes e sustentáveis. Atende na clínica Centerclin, em Sumaré.

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