Juiz condena ex-presidente da Câmara de Monte Mor e 33 réus por esquema de combustíveis
Ação de improbidade apurou manipulação sistemática de
quilometragem e justificativas genéricas para abastecimento de veículos do
Poder Legislativo montemorense entre 2017 e 2018; nova decisão confirmou
indisponibilidade de bens de envolvidos e fixou dano ao erário em mais de R$
183 mil
A Justiça de Monte Mor condenou o ex-presidente da Câmara Municipal Walton Assis Pereira, o ex-diretor da Casa William Freire dos Santos e outros 32 réus por improbidade administrativa em um esquema de uso irregular de veículos locados e consumo injustificável de combustíveis entre março de 2017 e maio de 2018.
Na sentença datada de 2 de dezembro, o juiz Luis Carlos
Martins, da 2ª Vara de Monte Mor, julgou parcialmente procedente a ação civil
pública movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, confirmou a
indisponibilidade de bens dos principais envolvidos e fixou o dano ao erário em
R$ 183,5 mil.
O magistrado acolheu a tese do Ministério Público de que
havia um padrão artificial nas planilhas de deslocamento apresentadas pelos
vereadores e seus assessores na época, com quilometragens quase sempre em torno
de 200 km por dia para parlamentares e 300 km para o presidente e o diretor,
além de discrepâncias em relação às distâncias reais indicadas por ferramentas
como o Google Maps.
Segundo a investigação, a soma da quilometragem declarada em
15 meses chegou a quase 350 mil km — o equivalente a 8 voltas ao redor da Terra
— para um município de cerca de 50 mil habitantes na ocasião.
Ao analisar o conjunto probatório, o juiz afirmou que
“restou amplamente comprovada a existência de um esquema de uso irregular de
veículos locados, com falsificação de registros de quilometragem e
justificativas genéricas para encobrir o desvio de finalidade e o consequente
dano ao erário”.
O juiz destacou que o laudo grafotécnico apontou
inconsistências de escrita e assinatura em planilhas de controle, com relato de
servidoras responsáveis pelo controle de uso dos veículos. Em depoimento, elas
disseram terem sido orientadas pelo então diretor da Casa para “refazer”
documentos já preenchidos, inserindo quilometragens indicadas por ele, com
anuência do presidente à época. Esses depoimentos, aliados ao confronto com
planilhas internas e distâncias efetivas, foram levados em conta para a
decisão. “A prova pericial e oral, em conjunto com os documentos, é
contundente”, registrou Martins.
Martins concluiu que não havia espaço para absolvição
generalizada. “O dolo aqui é manifesto e comprovado”, escreveu, ao ressaltar a
repetição sistemática de quilometragens fictícias, o uso de justificativas
vazias e a adulteração deliberada de documentos públicos.
Para o juiz, o caso extrapola falhas formais de controle e
se aproxima de um arranjo estruturado para custear, com dinheiro público,
deslocamentos sem comprovação de interesse público ou mesmo viagens de caráter
particular. Ao rechaçar o argumento de que se trataria apenas de erros
administrativos, ele observou que a manipulação de planilhas não pode ser
confundida com “simples inabilidade”. “Não se está diante de meras inabilidades
administrativas, mas de uma ação orquestrada para desviar e malversar recursos
públicos”, afirmou na fundamentação.
A responsabilidade mais grave foi atribuída ao ex-presidente e ex-diretor da Câmara. O juiz entendeu que, além de omissos, eles participaram da manutenção do esquema, autorizando abastecimentos sem controle adequado, admitindo justificativas genéricas e determinando alterações em documentos destinados a registrar o uso dos veículos oficiais.
Por isso, ambos foram
condenados ao ressarcimento integral do dano com combustíveis, no valor de R$
183,5 mil, a ser atualizado e acrescido de juros, à perda da função pública, à
suspensão dos direitos políticos por oito anos, à proibição de contratar com o
poder público ou receber benefícios fiscais e creditícios por dez anos e ao
pagamento de multa civil equivalente ao montante do dano.
Os demais condenados — ex-vereadores e assessores da época —
devem responder ao caso de forma individualizada, conforme tabela produzida
pelo Ministério Público com base na quilometragem declarada e no volume de
combustível vinculado a cada usuário, em valores que vão de pouco mais de R$
170 a quase R$ 13 mil.
A pena inclui ressarcimento do dano proporcional, perda da
função pública, suspensão dos direitos políticos por oito anos, proibição de
contratar com o poder público por dez anos e multa civil equivalente ao dano
individual.
Na leitura do juiz, “a manipulação de documentos públicos
com objetivo de simular a regularidade de gastos é, por sua própria natureza,
um ato doloso”.
O magistrado confirmou ainda a medida cautelar de
indisponibilidade de bens já deferida no início do processo e determinou a
nulidade dos atos administrativos que autorizaram o uso de combustíveis no
período investigado. A decisão ainda
cabe recurso. A reportagem não conseguiu contato com os citados.
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