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Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva e atua com foco na saúde e qualidade de vida

Coluna Nutrição Além do Prato

O processo real de emagrecimento: o que acontece com a gordura quando ela é “queimada”?

O emagrecimento é um dos temas mais falados e, paradoxalmente, um dos mais mal compreendidos da área da saúde. Embora pareça algo simples, “gastar mais do que se consome”, o processo biológico por trás da perda de gordura corporal é complexo e cheio de detalhes que merecem ser compreendidos. Afinal, o que realmente acontece com a gordura quando emagrecemos? Ela é “quebrada”? “Queimada”? E, principalmente, para onde ela vai?

Para começar, é importante entender que quebrar gordura e queimar gordura não são a mesma coisa. A primeira expressão se refere ao processo chamado lipólise, enquanto a segunda está relacionada à oxidação de ácidos graxos. Ambas acontecem em sequência, mas representam etapas diferentes no caminho da utilização da gordura corporal como fonte de energia.

Durante a lipólise, os triglicerídeos armazenados nos adipócitos (as células de gordura) são “quebrados” em partes menores: glicerol e ácidos graxos livres. Esse processo é estimulado principalmente por hormônios como a adrenalina, noradrenalina e o glucagon, especialmente em situações de déficit energético, como jejum ou exercício físico. É importante destacar que, até esse ponto, a gordura apenas foi mobilizada, ou seja, retirada do estoque. Ainda não foi realmente queimada.

A etapa seguinte é a oxidação dos ácidos graxos, que ocorre principalmente nas mitocôndrias das células musculares. É nesse momento que esses ácidos graxos são “queimados”, ou seja, sofrem reações químicas que liberam energia (na forma de ATP) para sustentar as funções do corpo. O subproduto dessa reação é o que a maioria das pessoas desconhece: a gordura não se transforma em suor nem em fezes, mas sim em dióxido de carbono (CO₂) e água (H₂O).

Estudos clássicos e revisões recentes mostram que cerca de 84% da gordura perdida é eliminada na forma de CO₂ pela respiração, e os outros 16% saem como água, através da urina, suor e vapor expirado. Portanto, quando dizemos que “queimamos gordura”, estamos literalmente falando de um processo metabólico que culmina em liberar energia e exalar o resultado pela respiração.

Esse conhecimento ajuda a esclarecer equívocos comuns em torno de métodos e procedimentos que prometem “quebrar gordura”. Ainda que alguns desses métodos possam de fato induzir a ruptura das células adiposas ou a liberação de gordura local, isso não significa que a gordura tenha sido “queimada” ou eliminada do corpo. Para que a perda seja real, é necessário que o organismo utilize esses ácidos graxos como combustível, o que só acontece quando há déficit energético, ou seja, quando o corpo precisa recorrer às suas reservas para gerar energia.

Em outras palavras, “quebrar” gordura é apenas abrir o cofre, enquanto “queimar” é usar o dinheiro que estava dentro. O processo só se completa quando o corpo efetivamente oxida essa gordura para produzir energia. Portanto, o verdadeiro emagrecimento não vem de procedimentos pontuais, mas da soma de fatores que favorecem a utilização das reservas energéticas: alimentação ajustada, prática regular de exercício físico, sono adequado e um ambiente hormonal equilibrado.

Compreender a diferença entre quebrar e queimar gordura é fundamental para não cair em promessas simplistas e para adotar estratégias que realmente favoreçam mudanças corporais sustentáveis. Em um mundo em que a pressa pelo resultado rápido é sedutora, a ciência segue lembrando que o emagrecimento verdadeiro acontece de dentro para fora e respira junto com a gente.

Marina Rocha Luciano é nutricionista clínica esportiva, formada pela UNICAMP (Universidade de Campinas) e com pós-graduação pela USP (Universidade de São Paulo). Atua com foco na promoção da saúde e qualidade de vida, melhora da composição corporal e da performance esportiva. Por meio de uma nutrição com propósito, respaldada na ciência, busca promover autonomia alimentar com estratégias individualizadas, eficazes e sustentáveis. Atende na clínica Centerclin, em Sumaré.

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