Região descarta 9 mil toneladas por ano de roupas usadas e tecido em aterros

Das 652,29 toneladas/dia de resíduos sólidos geradas pelos municípios, 4% são de trapos e panos que, misturados com o lixo orgânico, vão parar nos aterros da região, aponta estudo do Consimares

Todos os dias, 26 toneladas de resíduos têxteis produzidos na região vão parar nos aterros sanitários. São roupas, tecidos, retalhos que são descartados de maneira inadequada junto com o lixo orgânico. Em um ano, o volume de restos de panos que chegam nesses aterros ultrapassa 9 mil toneladas. 

A prática, afirmam especialistas, contamina o meio ambiente por causa dos componentes químicos utilizados nos tecidos que podem levar até 400 anos para se decompor. Os dados fazem parte do Plano Intermunicipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos do Consimares (Consórcio Intermunicipal de Manejo de Resíduos Sólidos) formado pelos municípios de Capivari, Elias Fausto, Hortolândia, Monte Mor, Nova Odessa, Santa Bárbara d’Oeste e Sumaré.

De acordo com o estudo gravimétrico realizado pelo Consórcio, 4% das 652,29 toneladas/dia de resíduos depositadas nos aterros da região são de panos e trapos. Os municípios da área de cobertura do Tribuna Liberal (Sumaré, Nova Odessa, Hortolândia e Monte Mor) produzem 19,1 toneladas de resíduos têxteis por dia. Os maiores geradores, segundo o estudo gravimétrico, são Sumaré e Hortolândia, municípios que fazem parte da RPT (Região do Polo Têxtil), com 8,4 t/dia e 6,7 t/dia, respectivamente. Monte Mor produz 1,9t/dia e Nova Odessa 1,8 t/dia.

“Muitos dos tecidos que vão para o aterro, para o nosso lixo do dia a dia são roupas que não servem mais e poderiam ser usadas por outras pessoas. É preciso conscientizar a população do quanto os tecidos contaminam o meio ambiente e da importância da reutilização das peças. O Brasil gera 160 mil toneladas/ano de tecido e pelo menos 50% poderia ser reciclado, utilizado de outra forma”, alerta o superintendente do Consimares, Valdemir Aparecido Ravagnani.

Apesar do cenário preocupante, o Plano Intermunicipal de Gestão dos Resíduos Sólidos do Consórcio não prevê ações específicas para reciclagem de resíduos têxteis. Ravagnani indica a economia circular como a melhor saída para o reaproveitamento de roupas usadas.

“Recentemente, uma startup de venda e compra de roupas usadas, de Curitiba, se instalou em Campinas. Os brechós são um segmento com alto potencial de recuperação e reutilização de roupas. Já vi experiências assim na Itália. Na Suécia tem até shopping center de roupas usadas”, observa o superintendente.

“O tecido é um produto que pode ser incinerado, sem problema algum, mas, o ideal é a reutilização. Esses resíduos só devem ir para o aterro ou usina de incineração em último caso, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação”, completa Ravagnani.

Em entrevista à CBN Brasil, em junho deste ano, o engenheiro civil e ambiental da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Júlio Cesar Silva, reforça o prejuízo do descarte incorreto de materiais têxteis para o meio ambiente. “Têm tecidos que podem levar de cinco a dez anos para se decompor na natureza, tem tecido que pode demorar centenas de anos para se degradar. Quando se faz esse descarte, você tem a pigmentação. Esse tingimento vai contaminar mais um tipo de solo, enquanto outros vão contaminar menos”, explica o especialista.

CRIME AMBIENTAL

O descarte irregular de tecidos é considerado crime ambiental de acordo com a lei federal 12.305/2010. Em Hortolândia, a Prefeitura diz fiscalizar o descarte inadequado de tecidos em vias e áreas públicas da cidade. Após orientação, em caso de reincidência, há notificação e/ou multa, informa a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

De acordo com o órgão, a população pode fazer denúncias de descarte irregular de tecidos e de outros tipos de materiais por meio do aplicativo Agenda Verde, que pode ser baixado nas plataformas Google Play ou App Store.

Os PEVs (Pontos de Entrega Voluntária de entulho e outros materiais recicláveis) disponibilizados pelo município não recebem sobras de tecido. Em razão disso, a Secretaria orienta os moradores a reutilizar restos de pano para confecção de outras peças. Também sugere a doação desse material para associações, entidades ou cooperativas que trabalhem com o reaproveitamento de resíduos têxteis.

Já para as indústrias têxteis e empresas de confecção de roupas existentes em Hortolândia, a orientação da Secretaria é para que façam o descarte correto das sobras de tecidos conforme a legislação vigente para o setor em que atuam. A lei federal obriga que o gerador do resíduo faça o gerenciamento, armazenamento, transporte e destinação final adequada dos detritos têxteis.

As prefeituras de Sumaré, Nova Odessa e Monte Mor foram contatadas por meio das suas assessorias de imprensa, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.

Em Hortolândia, aprendizes transformam retalhos em bolsas e acessórios

Em Hortolândia, 16 mulheres do curso de costura e modelagem realizado pela prefeitura em parceria com o IFSP (Instituto Federal de São Paulo) transformam retalhos em diversos produtos utilizados no dia a dia. Parte do material reaproveitado vem das sobras de tecidos utilizados pela administração na confecção de uniformes escolares.

Nas mãos das aprendizes do CQP I (Centro de Qualificação Profissional), localizado no Jd. Santa Clara, retalhos ganham novo destino e voltam para o consumo em forma de bolsas, tapetes, estojos, sacolas, acessórios para cabelo, roupas customizadas, dentre outros. Além dos tecidos que sobram da produção de uniforme escolar, elas utilizam retalhos de outros parceiros do grupo.

De acordo com Amarantino Sampaio, diretor de Geração de Renda e Economia Solidária, órgão da Secretaria de Inclusão e Desenvolvimento Social, o objetivo do curso, além de ensinar as técnicas de costura e modelagem, é oferecer aprendizagem teórica sobre empreendedorismo. “Queremos que depois de concluído o curso essas mulheres possam utilizar esse aprendizado como forma de geração de renda”, afirma.

Para participar do curso, completa o diretor, as aprendizes recebem uma bolsa-auxílio mensal no valor de R$ 170 mensais oferecida pelo IFSP, também responsável pela parte teórica da formação que tem duração de cinco meses.

Depois de prontas, as peças artesanais confeccionadas pelas aprendizes são expostas e comercializadas em feiras realizadas no município. Em breve, segundo Sampaio, o grupo de mulheres será incluído na feira de economia solidária realizada pela prefeitura onde terão um espaço para vender os produtos. “Além disso, estamos iniciando o processo de qualificação dessas mulheres para formar uma cooperativa de costura”, adianta o diretor. 

Polo Têxtil terá projeto piloto sobre economia circular para reaproveitar resíduos

O APL (Arranjo Produtivo Local) Têxtil e de Confecção de Americana, Nova Odessa, Santa Bárbara d’Oeste, Sumaré e Hortolândia foi escolhido para a implantação de um projeto piloto sobre economia circular. O trabalho será realizado pelo governo do Estado em parceria com o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas). A informação é do Sinditec (Sindicato das Indústrias Têxteis da Região).

O presidente da entidade, Leonardo Sant’Anna, comentou, por meio da sua assessoria de imprensa, que o descarte de resíduos têxteis e do vestuário é uma grande preocupação para o setor. Segundo Sant´Anna, o assunto vem sendo discutido pelo sindicato e pelo APL, razão pela qual foram escolhidos para iniciar o projeto de economia circular.

A proposta, conta o presidente, foi apresentada em julho no Sinditec pela coordenadora de Desenvolvimento Regional e Territorial da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Adriana Tedesco Telerman, pela diretora de Inovação e Negócios do IPT, Claudia Echevenguá Teixeira, e equipe técnica do instituto. A implantação deve acontecer em breve.

Na região de abrangência do sindicato existem cerca de 1.200 indústrias têxteis e 2.500 de confecções. Os dados são do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), referentes ao ano de 2021. Por enquanto, não há informação do volume de resíduos que são descartados, reaproveitados e reciclados por essas empresas. O Sinditec adiantou que o levantamento fará parte das ações do projeto piloto.

O conceito de economia circular está baseado em promover ações de responsabilidade socioambiental, envolvendo pessoas e empresas com a finalidade de repensar novos projetos, reduzir impactos e resíduos, reutilizar produtos e reciclar materiais e energia. A construção de uma economia circular representa ainda projetar melhores produtos e serviços.

Sant´Anna ressaltou que já existe uma estrutura na região para receber esse projeto, com integração da cadeia têxtil, e que o setor já pratica ações de economia circular, como a reciclagem e reaproveitamento de materiais, como cones, papelão, plástico, óleo, restos de fios e retalhos de tecidos, mas é um processo que precisa ser aprimorado. 

Outro ponto importante da proposta, segundo o presidente do Sinditec, é que contemplará a destinação alternativa e mais nobre para o lodo do tratamento de efluentes de estações biológicas têxteis, além da possibilidade de criação de um selo ou certificado das empresas que tem preocupação com o meio ambiente e investem em sustentabilidade.       

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